terça-feira, 7 de agosto de 2007

Tristezas do Jeca

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Conhecida também como "Tristeza do Jeca", esta toada nasceu em Botucatu em 1918, popularizando-se no interior paulista por volta de 1922. Então, gravada pela Orquestra Brasil-América (1924) e pelo cantor Patrício Teixeira (1926), ganhou o país, convertendo-se num dos maiores clássicos de nossa música sertaneja.
Importante centro econômico do estado de São Paulo, Botucatu registrava já àquele tempo uma razoável movimentação artística, reunindo cantadores e músicos, entre os quais o autor da composição, Angelino de Oliveira. "Era um humilde tocador de violão e guitarra portuguesa", dizia o compositor Ariovaldo Pires (Capitão Furtado), amigo pessoal de Angelino. Com sua melodia e letra pungentes, "Tristezas do Jeca" canta as mágoas de um matuto apaixonado:
Tristeza do Jeca - Angelino de Oliveira---clique para ouvir amostra da música
---D --------G ----------D -------------A7
Nestes versos tão singelos / Minha bela,
----------D----------- G----------- D------------ A7
Meu amor / Pra você quero cantar o meu sofrer
---------------D --D7 ----G-------------------- D
E a minha dor / ------Eu sou que nem o sabiá
---------------B7--------- Em----------- A7
Quando canta é só tristeza / Desde galho
--------------D
onde ele está
-----A7---------------------------------- D
Nesta viola eu canto e gemo de verdade
-----A7------------------------------ D
Cada toada representa uma saudade (bis)

--D------ G----------- D-------------- A7------------ D
Eu nasci naquela serra / Num ranchinho beira-chão
------------G-------- D------------ A7-------- D--- D7
Todo cheio de buraco / Onde a lua faz clarão
------G------------------- D-------------- B7---------- Em
Quando chega a madrugada / Lá no mato a passarada
--------A7------------ D
Principia um barulhão (refrão)

---D -----G----------------- D
Vou parar com a minha viola
------------A7------------ D
Já não posso mais cantar
-----------G -----------D -----------A7---------- D--- D7
Pois o jeca quando canta tem vontade de chorar
-------G -------------D ---------B7------------ Em
O choro que vai caindo/ Devagar vai se sumindo
--------------A7------------ D
Como as águas vão por mar ( refrão )

Luar de Paquetá

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"Luar de Paquetá" é a mais conhecida das composições sobre a bucólica ilha, que inspirou tantas outras canções e até um romance célebre, A Moreninha, de Joaquim Manoel de Macedo. E merece essa popularidade muito mais pela melodia de Freire Júnior do que pelos versos de Hermes Fontes.

Um exagerado simbolista, o poeta impregnou a canção de imagens afetadas como "nereidas incessantes", "hóstia azul fervendo em chamas", "noites olorosas"... Aliás, a propósito desta imagem, há algumas gravações em que os intérpretes - entre os quais Francisco Alves - trocam o adjetivo e cantam "nessas noites dolorosas". Lançado em 1922, "Luar de Paquetá" estendeu seu sucesso ao ano seguinte, quando deu nome a uma revista teatral.

Luar de Paquetá - Freire Jr. / Hermes Fontes---clique para ouvir amostra da música

Nestas noites dolorosas, / Quando o mar desfeito em rosas,
Se desfolha à lua cheia, / Lembra a ilha onde me oculto,
Onde o amor celebra em tudo, / Todo o encanto que a rodeia.
Nos canteiros ondulantes, / As nereidas incessantes,
Abrem lírios ao luar, / A água em prece burburinha,
Em redor da capelinha / E vai rezando o verbo amar.

Jardim de afetos, pombal de amores, / Humildes tetos de pescadores,
E a lua brilha - que bem nos dá - / Amar na Ilha de Paquetá !

Pensamento de quem ama / Oh que beijo ardendo em chama
Entre lábios separados, / Pensamento de quem ama,
Leva o meu radiograma / Ao jardim dos namorados,
Onde há esse paraíso / O caminho que idealizo,
Na ascensão para este altar, / Paquetá é um céu profundo
Que começa neste mundo / Mas não sabe onde acabar...

Ai, seu Mé

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No final de 1921, a campanha eleitoral para a sucessão do presidente Epitácio Pessoa empolgava o país. Eram candidatos Artur Bernardes, pela situação, e o dissidente Nilo Peçanha, pela oposição. Vítima de uma calúnia jornalística, Bernardes cairia na antipatia do povo, que passou a chamá-lo de "Carneiro", "Rolinha" e "Seu Mé". A razão dos apelidos era sua suposta passividade diante das maquinações políticas, defeito que lhe atribuíam os adversários.
Acreditando numa derrota do candidato oficial, os compositores Freire Júnior e Careca (Luís Nunes Sampaio) decidiram, então, participar da campanha ridicularizando-o na marchinha "Ai Seu Mé":
"Ai Seu Mé / ai Seu Mé / lá no Palácio das Águias, olé / não hás de pôr o pé (...) Rolinha desista / abaixe esta crista (...) a cacete / não vais ao Catete / não vais ao Catete...".
Na realidade um plágio, uma espécie de colagem de três sucessos da época - o fox "Salomé" (de R. Stolz e E. Neri, que teve uma versão em português com o título de "Abajur" ); a canção "Mimosa" (de Leopoldo Fróes); e a marcha "Ai Amor" (do próprio Freire Júnior) - o "Ai Seu Mé" caiu imediatamente nas graças do público, tornando-se o grande sucesso do carnaval de 1922, apesar da proibição da polícia, que chegou a recolher os discos gravados pelo Baiano e a Orquestra Augusto Lima.
Contrariando o prognóstico dos autores, "Seu Mé" foi eleito, empossado e passou quatro anos no Palácio das Águias, governando sob estado de sítio. E de nada valeu a precaução de assinarem a composição com o pseudônimo de "Canalha das Ruas", pois Freire Júnior acabou sendo "preso e recolhido à solitária por duas ou três vezes" (segundo o historiador Ary Vasconcelos), enquanto Careca, mais esperto, passava uma temporada escondido, fora do Rio. Se Mário de Andrade fosse comentar esta história, diria certamente: "mas isso é tão Brasil...".

Ai, Seu Mé (marcha - 1922) - Freire Júnior e Careca

O Zé Povo quer a goiabada Campista
Rolinha desista / Abaixe esta crista
Embora se faça uma "bernarda"
A cacete / Não vais ao Catete
Não vais ao Catete

Ai seu Mé / Ai Mé Mé
Lá no Palácio das Águias, olé
Não hás de pôr o pé

O queijo de Minas tá bichado
Seu Zé / Não sei porque é
Não sei porque é
Prefira bastante apimentado, Yayá
O bom vatapá / O bom vatapá

Esta nega qué me dá

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A melodia é pobre, a letra apenas razoável: "Esta nega / Qué mi dá / Eu não fiz nada / Prá apanhá...". Mas o título de duplo sentido acabaria por fazer deste samba um dos sucessos do carnaval de 1921.
Seu autor, Caninha , aqui em parceria com o bailarino Lezute, foi um dos mais ativos compositores da primeira geração de sambistas, chegando a rivalizar com Sinhô no início dos anos vinte.
Seus sucessos, porém, ficaram restritos a esse período, embora ele tenha vivido até 1961. Freqüentador da casa da Tia Ciata, Caninha (Oscar José Luís de Morais) ganhou o apelido quando, adolescente, vendia rolete de cana nas imediações da Central do Brasil, no Rio de Janeiro.
"O Canninha, sempre procurou seguir as pégadas do Sinhô, não logrando, porém, o mesmo successo. Por mais que se esforçasse, o Canninha jamais conseguio siquer aproximar-se do Rei do Samba, ou ter um logar de destaque na sua Côrte...
E' que as produções do conhecido muzicista, quasi sempre peccavam pelo imprevisto... asnatico, tão proprio do popularissimo compositor que teve o topete de dizer que o Maestro Francisco Braga, ouvindo no cinema Odeon este samba manteve com elle o seguinte dialogo :

MAESTRO F. BRAGA: – «Seu Canninha», o senhor sabe muzica ?
CANNINHA: – (risonho e amavel) Maestro eu engulo um bocadinho de cabeça de nota!...
MAESTRO F. BRAGA: – (Enthusiasmado) Pois olhe, seu Canninha, este seu samba, até parece muzica classica !
CANNINHA: - Se isto é verdade, o maestro Francisco Braga está na obrigação de uma grande penitencia perante Santa Cecilia!

Já vae longo este capitulo e o assumpto dá margem a outros. Prometto continuar, porque «piano, piano...»" (Na Roda do Samba - Francisco Guimarães (Vagalume) - Rio de Janeiro, 1933)

Pé de anjo

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Sinhô apreciava tanto a valsa francesa "Geny (C'Est Pas Dificile)" que acabou plagiando-a na marchinha "O Pé de Anjo". E deu certo, pois "O Pé de Anjo" caiu nas graças do povo, tornando-se o maior sucesso do carnaval de 1920 e até originando uma revista musical que adotou o seu título.
Foi, ainda, a primeira música gravada por Francisco Alves, sendo lançada juntamente com "Fala meu Louro" no suplemento inaugural do selo Popular, de efêmera duração. Quanto ao título, tratava-se de uma zombaria aos pés enormes do China, dando assim continuidade à interminável rixa entre Sinhô e seus desafetos preferidos: os irmãos China e Pixinguinha.
O pé de anjo (Sinhô)---- clique para ouvir amostra da música

C----------------- Dm- --------------------- C/E
Eu tenho uma tesourinha / Que corta ouro e marfim
C--------------------- G------D7------------------ G7
Serve também para cortar / Línguas que falam de mim

C------------ Dm---------------- G7----- C
Ó pé de anjo, ó pé de anjo / És rezador, és rezador
A7------------------- Dm------------------------ D7
Tens um pé tão grande / Que és capaz de pisar
G7------------- C
Nosso Senhor, Nosso Senhor

C------- C#º-------Dm------------------------ C/E
A mulher e a galinha / São dois bichos interesseiros
C----- ----------- G------- D7-------------- G7
A galinha pelo milho / E a mulher pelo dinheiro.

Fonte: A Canção no Tempo - Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello - Editora 34

Fala meu Louro

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Uma sátira à derrota de Rui Barbosa na eleição presidencial de 1919 em que obteve menos da metade dos votos do vencedor, Epitácio Pessoa -, "Fala Meu Louro" é o melhor samba da fase inicial de Sinhô. Mas a letra referindo-se à terra de Rui ( "A Bahia não dá mais coco / pra botar na tapioca..." e ao súbito mutismo do conselheiro, sempre tão falante ( "Papagaio louro / do bico dourado / tu falavas tanto / qual a razão que vives calado..."), acabou por irritar os baianos ligados ao samba, que se julgaram atingidos.
Assim, o revide foi imediato através de "Entregue o Samba aos Seus Donos", composição de Hilário Jovino Ferreira, que já havia alfinetado Sinhô no ano anterior com "Não És Tão Falado Assim". Só que agora Mestre Hilário partia para o ataque direto, acusando-o de plagiário. Naturalmente nada impede, e é até provável, que ao fazer "Fala Meu Louro"', Sinhô tenha pretendido provocar ao mesmo tempo Rui e os baianos liderados por Jovino, um pernambucano criado em Salvador.
Fala meu Louro - 1919 (Sinhô)-----clique para ouvir amostra da música

A Bahia não dá mais coco
para botar na tapioca
Pra fazer o bom mingau
para embrulhar o carioca

Papagaio louro do bico dourado
Tu falavas tanto
qual a razão que vives calado

Não tenhas medo
coco de respeito
Quem quer se fazer não pode
Quem é bom já nasce feito

Tristeza de caboclo

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Tristeza de Caboclo é um tanguinho, a primeira música que Marcelo Tupinambá compôs sob o contrato com Campassi & Camin, editores de São Paulo.
Com letra de Arlindo Leal, ela se tornou um sucesso instantâneo, vendendo o número fenomenal de 120.000 partituras para piano em um ano.

Tristeza de Caboclo (1919) -----clique para ouvir amostra da música

– Letra de Arlindo Leal e música de Marcelo Tupinambá


Quando na roça anoitece / Fico sempre a meditá!.. / (Coro) Fica sempre a meditá!... (bis) / Meu coração, que padece, / Não me deixa sossegá!... / (Coro) Não o deixa sossegá!.. (bis)


Estribilho: Minh'arma, com fervô, / Quando ha lua / Chora o seu amo / E sem podê se aconsolá / Garra logo a suspirá!... / (Coro) Quem ama, com fervô, etc.

Meu coração, com tristeza, / Quando surge o bom luá. / (Coro) Quando surge o bom luá... (bis) / Sabe, com muita firmeza, / Seus queixumes disfarçá!... / (Coro) Seus queixumes disfarçá!.. (bis)

Estribilho: Minh'arma, com fervô, etc.

Quem sabe amá, com ternura, / Nunca deixa de sonhá... / (Coro) Nunca deixa de sonhá! (bis) / Não sofre a negra amargura / Que me anda a acabrunhá! (Coro) Que o anda a acabrunhá!.. (bis)

Estribilho: Minh'arma, com fervô, etc.

Quando eu pego na viola, / Com vontade de cantá, / (Coro) Com vontade de cantá!... (bis) / Meu coração se aconsola, / Alliviando seus pená!.../ (Coro) Alliviando seus pená!... (bis)

O despertar da montanha

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"Você acaba de fazer o seu "Danúbio Azul", disse o professor Guilherme Fontainha a Eduardo Souto, quando este lhe mostrou, ao piano, "O Despertar da Montanha". Peça essencial do repertório pianístico brasileiro, típica dos saraus do início do século, "O Despertar da Montanha" é a obra mais conhecida de Souto. Lançada em 1919, com sucesso imediato, tem na capa da edição inicial curioso desenho, que mostra uma cena pastoril de natureza européia: ao pé de suntuosa montanha, um pastor descansa tocando flauta, enquanto seu cão vigia um rebanho de quinze ovelhas...

Mas, se a cena é européia, a composição é bem brasileira, tendo ajudado até a fixar uma forma de tango, que Eduardo Souto chama de tango de salão, diferente dos tangos de Nazareth, mais próximos do choro. "O Despertar da Montanha" tem uma letra de Francisco Pimentel, que nada lhe acrescenta.

O Despertar da Montanha - 1919--- clique para ouvir amostra da música
(Eduardo Souto e Francisco Pimentel)
A noite entra na agonia, / E os primeiros raios, / Na moldura do horizonte, / Iniciam seus ensaios, / Doura-se um monte... / E os ramos mais felizes, / Os que estão mais altos, / Lutam em matizes, / No cimo do planalto... / Sai da sombra um novo dia.

É a luz da madrugada, / Entrando suavemente na floresta, / Beija os ninhos, / É a festa, / Desperta os passarinhos / Envolve os velhos troncos, / Vindo através das folhagens, / E os gritos, pios, uivos, guinchos, roncos, / Em acordes selvagens, / Anunciam a alvorada.

Desses cantos, sob o sol da manhã, / Em linda festa pagã, / Escorre a vida, cheia de encantos, / E transborda, numa chuva de cores, / E entre os vales sonhadores, / A montanha acorda.

Já te digo

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Considerando-se atingidos pelo "Quem São Eles", os irmãos Pixinguinha e China (Otávio da Rocha Viana) revidaram com o "Já Te Digo", em que achincalham o rival Sinhô. Terceira resposta ao "Quem São Eles" esta foi também a de maior sucesso e a mais cruel ( "Ele é alto, magro e feio / e desdentado / ele fala do mundo inteiro / e já está avacalhado..."), sendo as outras o "Fica Calmo que Aparece", de Donga, e "Não És Tão Falado Assim", de Hilário Jovino.O curioso é que, a rigor, a polêmica foi gratuita, pois não havia no samba de Sinhô qualquer alusão ofensiva aos adversários.
Pela repercussão alcançada no carnaval de 1919, "Já Te Digo" projetou Pixinguinha como compositor. Com uma forma musical mais definida do que a maioria criada por seus contemporâneos, ele extravasava em suas composições um conhecimento teórico de música superior. "Já Te Digo" tem a forma A-B-A-C-A-D-A, sendo que cada grupo de quatro compassos é repetido sempre ao longo de cada segmento. A composição é ainda o primeiro exemplo da extraordinária capacidade de Pixinguinha de prender ouvinte já na introdução, um primor neste caso. Mais tarde, como arranjador de música alheia, isso se repetiria constantemente. Por coincidência, "Já Te Digo" e "Quem São Eles" foram lançados por um mesmo cantor, o Bahiano da Casa Edison.

Já te digo - Pixinguinha e China ----clique para ouvir amostra da música

Um sou eu, e o outro não sei quem é
Um sou eu, e o outro não sei quem é
Ele sofreu pra usar colarinho em pé
Ele sofreu pra usar colarinho em pé

Vocês não sabem quem é ele, pois eu vos digo
Vocês não sabem quem é ele, pois eu vos digo
Ele é um cabra muito feio, que fala sem receio
Não tem medo de perigo
Ele é um cabra muito feio, que fala sem receio
Não tem medo de perigo

Um sou eu, e o outro não sei quem é
Um sou eu, e o outro não sei quem é
Ele sofreu pra usar colarinho em pé
Ele sofreu pra usar colarinho em pé

Ele é alto, magro e feio / É desdentado
Ele é alto, magro e feio / É desdentado
Ele fala do mundo inteiro / E já está avacalhado no Rio de Janeiro
Ele fala do mundo inteiro / E já está avacalhado no Rio de Janeiro

Vocês não sabem quem é ele, pois eu vos digo
Vocês não sabem quem é ele, pois eu vos digo
Ele é um cabra muito feio, que fala sem receio
Não tem medo de perigo
Ele é um cabra muito feio, que fala sem receio
Não tem medo de perigo

Quem são eles?

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A carreira de Sinhô começa já com um sucesso, o samba "Quem São Eles", cantado no carnaval de 1918. Com seus versos pitorescos ( "A Bahia é boa terra / ela lá e eu aqui..."), o samba era dedicado a um bloco homônimo, ligado ao Clube dos Fenianos. Como os ânimos no meio musical continuassem agitados com a polêmica do Pelo telefone, o título Quem são eles? acabou sendo tomado como uma provocação pelos adversários de Sinhô, causando nova polêmica. Proposital ou não, esta provocação apenas prenunciava outras tantas que se sucederiam na vida do irrequieto sambista, ajudando-o em sua permanente busca de promoção.

"Quem São Eles" já revela o talento rítmico de Sinhô especialmente no habilidoso uso das síncopes naturais na letra, independentemente da música, presente nos "que" dos versos "Não era assim que meu bem chorava" e "Não precisa pedir que eu vou dar". No entanto, seu estilo como compositor só iria se definir a partir de 1920.


Quem são eles? - 1918 (Sinhô)

A Bahia é terra boa / Ela lá e eu aqui - Yayá
Ai, ai, ai / Não era assim que meu bem chorava
Não precisa pedir eu que eu vou dar
Dinheiro não tenho mas vou roubar
Carreiro olha a canga do boi / Carreiro olha a canga do boi
Toma cuidado que o luar já se foi
Ai que o luar já se foi / Ai que o luar já se foi
O castelo é coisa a toa / Entretanto isso não tira - Yayá
Ai, ai, ai / É lá que a brisa respira
Não precisa pedir que eu vou dar
Dinheiro não tenho mas vou roubar
Quem são eles? / Quem são eles?
Diga lá e não se avexe - Yayá
Ai, ai, ai / São peixinhos de escabeche
Não precisa pedir que eu vou dar
O resto do caso pra que cantar
O melhor do luar já se foi / O melhor do luar já se foi
Entre menina que aqui estão de horror
Ai, que aqui estão de horror / Ai, que aqui estão de horror

O matuto

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A partir de meados dos anos dez, a música rural paulista saiu do âmbito regional, espalhando-se pelo país. Para isso foi decisivo o trabalho do compositor Marcelo Tupinambá, estilizador do gênero. Com toadas, cateretês e tanguinhos - preferia usar o diminutivo para diferenciar seus tangos dos de Ernesto Nazareth -, ele reinou no meio musical até o início da década de vinte.

Um de seus maiores sucessos é o cateretê O matuto, em que conta o desejo de um cearense desgarrado de voltar à sua terra: "Pro sertão do Ceará / tomara já vortá / tomara já vortá...". A escolha de um tema como este, ligado a outro estado, parece indicar uma aspiração do autor a se popularizar além das fronteiras paulistas.

Natural de Tietê, filho de uma família de músicos, Marcelo Tupinambá chamava-se realmente Fernando Lobo, tendo adotado o pseudônimo em razão dos preconceitos que existiam na época contra a música popular. A mudança de nome aconteceu por volta de 1915 em conseqüência do sucesso do maxixe São Paulo Futuro, de sua autoria. Ele contava que na ocasião, cursando a Escola Politécnica de São Paulo, onde se formou no ano seguinte, foi chamado ao gabinete do diretor Paula Souza, que o censurou: "Não permito que aluno meu ande fazendo maxixes. Quem vai confiar num engenheiro que faz maxixes?". Depois desta advertência, Fernando Lobo virou Marcelo Tupinambá.


O matuto (Canção Cearense) - 1918 - versos de Cândido Costa e música de Marcelo Tupinambá


Quando foi da meia-noite para o dia, / que eu deixei com cortezia / minha terra, o Ceará / as foias véias já cabia pela estrada, / vim marchando na picada / só na seca a matutá:

Pro sertão do Ceará / Tomára eu já vortá... / Tomára eu já vortá... (bis)

No cemiterio os mortos se alevantaram / uns aos outros perguntaram / que qu'eu havéra de querê? / nas catacumba os defunto té gemia / no céo as coruja ria / Eu mesmo não sei porquê...

Pro sertão do Ceará / Tomára eu já vortá... / Tomára eu já vortá... (bis)

As santas fêmea, na igreja já chorava / os santos macho só me oiava / com cada ôio assim! / Até os gallo e as gallinha não sabia / de corrê p'ra onde havia / tudo com medo de mim!

Pro sertão do Ceará / Tomára eu já vortá... / Tomára eu já vortá.... (bis)

Quando eu cheguei dessa viagem cá no Rio / foi qu'antão logo se viu / qu'é qu'eu vinha cá fazê: / eu fui chamado só p'ra sê o presidente / desta terra, desta gente / sê o rei de vosmucês

Pro sertão do Ceará / Tomára eu já vortá... / Tomára eu já vortá... (bis)

Logo o povo, muito amavo, foi dizendo / o dote qu'eu ia tendo: / o Pará, França, o Japão, / um iscalé com doze remo e vinte peça / mas abanei co'a cabeça / dizendo "Não quero, não!"

Pro sertão do Ceará / Tomára eu já vortá... / Tomára eu já vortá... (bis)

Agora vorto p'r'o meu ceará querido / sinão fico home perdido / é mió eu i p'ra lá! / Quero i m'imbora e hei de i até a nado / sinão fico avaccaiado / como todo mundo está!

Pro sertão do Ceará / Tomára eu já vortá... / Tomara eu já vortá...