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Foto da homenagem que, em maio de 1924, foi prestada a Lord Alisa, pelo Grupo da
Arrancada, filiado ao Clube dos Democráticos (Biblioteca Amadeu Amaral - FUNARTE). |
Quando Vicente Alfredo Duarte Felix, depois de ter sua
proposta de admissão no ‘castelo’ aprovada, — não formalmente, apenas, mas com
grande júbilo — veio a ganhar o título de Lord Alisa, não botou banca de
nobreza. Pelo contrário. Foi justamente em virtude dessa honraria carnavalesca
que se sentiu autenticado como Democrata. E operoso, realizador, passou a
trabalhar com denodo para a grandeza do clube alvinegro. Seus encargos como
gerente do
Correio da Manhã eram muitos e absorventes. Mesmo assim, ele
conseguia meios e modos de se dedicar, por igual, à empresa jornalística e à
sua agremiação. Servia, e bem, há dois anos, tal como o Arlequim de Goldoni.
Graças ao desvelo com que cuidava de suas obrigações nos dois setores — o da
imprensa e o do Carnaval — Duarte Felix e Lord Alisa, nomes diversos de uma só
pessoa, carreavam para um e outro louvores e admiração. Edmundo Bittencourt, e
depois o filho Paulo, tinham em Felix o seu braço direito. O Clube dos
Democráticos venerava-o e ao fazê-lo presidente perpétuo mostrava a gratidão de
todo seu quadro social ao companheiro Lord Alisa, o ‘carapicu’ a quem se devia
o apogeu da sociedade. Fez-se credor, portanto, das carinhosas homenagens que
teve ao morrer. Merecia levar, dentro do esquife, como levou, junto com as
bandeiras de Portugal, sua pátria, e do Brasil, no qual viveu amando-o e
trabalhando, a do grêmio carnavalesco por ele engrandecido.
No princípio a tesoura
Português, de Monsa, no Alentejo, onde nasceu a 20 de fevereiro de 1869, Duarte
Felix depois de já ter estado no Brasil por algum tempo, retornou à sua terra.
Pouco depois, com 27 anos de idade, casado com dona Maria da Conceição, aqui
estava novamente e para se fixar em definitivo. Trazia como cabedal os
apetrechos de seu ofício de alfaiate: tesoura, agulha, giz e esquadro. Tendo
como principal freguesia a gente de teatro e com sua vocação para o palco,
conseguiu fazer-se ator e integrar alguns elencos. Um dia, porém, — como disse
Luiz Palmeirim em discurso que proferiu no enterramento de Duarte Felix — “compreendeu
que não devia mais pintar a cara”, e deixou a ribalta. Eugenio da Silveira, que
editava o União Portuguesa, chama-o para administrar o seu jornal. Duarte Felix
se desempenha bem no novo mister, mostrando aptidão para o cargo.
Sabedor de sua competência, Edmundo, que era freguês de uma barbearia na Rua do
Ouvidor, ao lado do
Correio da Manhã, ali conheceu Duarte Felix e o convidou
para gerente de seu matutino. Ativo, trabalhador, em pouco tempo evidenciava
tino administrativo. Firmara a situação econômica da empresa, que se transferiu
para um grande prédio no largo da Carioca e, mais tarde, na Avenida Gomes
Freire estabelecia sede própria. Tudo isso acontecendo com Felix já feito
associado do Clube dos Democráticos, onde, pelo hábito de passar a mão
carinhosamente no ombro das pessoas com quem falava, ganhara o clássico título
de Lord Alisa e em cuja agremiação entrara por influência de Edmundo que já era
sócio benemérito.
Baluarte e incansável
Logo depois de ter assumido a gerência do Correio, em 1904, Duarte Felix
tornava-se Democrático. Eleito presidente, no seu feitio de realizador, começou
a marcar sua atuação no ‘castelo’ (sede do clube) com grandes iniciativas. Do
prédio da Rua dos Andradas, em frente ao largo do Rosário, onde a sociedade já possuía
confortável salão para seus ‘maxixéticos forrobodós’, transferiu-a para a Rua
do Passeio nº 62, esquina da Rua das Marrecas. Mudança que se constituiu, como
seria justo, em notório acontecimento, ensejou aos consócios de Felix exaltar
seus merecimentos.
No dia 11 de setembro de 1920 um gritante puff de quase
página inteira do
Correio da Manhã glorificava-o: “
O grande Lord Alisa! — Foi ele
que a idéia deu / E foi seu executor... / Desde a planta concebeu! / Foi
arquiteto, feitor / Mestre d’obras, carpinteiro; / Foi tudo num tempo só! / Foi
Alisa, pois, o obreiro! / Levantou paredes, pó!”
Sempre numa constante de empreendimentos que alçavam os ‘carapicus’ a uma
superioridade flagrante sobre os seus coirmãos ‘gatos’ e ‘baetas’, Vicente
Duarte Felix jamais poderia deixar de presidi-los. Daí sob aclamações vibrantes
de toda a assembléia, ser-lhe outorgada a perpetuidade no cargo, gesto que
vieram a repetir em relação a Alfredo Silva (Lord Carta Branca), seu substituto
no posto e exercendo-o até hoje.
Mas, embora a instalação do clube na Rua do
Passeio lhe proporcionasse outro ótimo salão e conforto, o presidente Felix
planejava a aquisição de casa própria. Comprou então um terreno na Avenida
Gomes Freire nº 471, mas, tendo-se em conta a cordialidade reinante entre
Democráticos e o
Correio da Manhã, foi a este cedido e a sociedade adquiriu
outro na rua do Riachuelo nº 93.
E lá está, imponente, o ‘castelo’ dos
alvinegros, inaugurado festivamente no dia 30 de dezembro de 1930 por Alfredo
Alves da Silva e com a presença de Adolfo Bergamini, então interventor no
Distrito Federal. Duarte Felix, que havia morrido a 8 de junho de 1929, não
teve o prazer de vê-lo concluído.
Morre um perpétuo, elege-se outro
Com o falecimento de Duarte Felix, perdia o veterano Clube dos Democráticos,
fundado a 19 de janeiro de 1867, por General Topázio, Frei Mochila, José do
Beco e outros foliões, o grande baluarte que foi o Lord Alisa. Acompanhando o
seu esquife, que saiu com um numeroso cortejo da Avenida Marechal Trompowsky — e
antes de baixar à sepultura passou em frente ao ‘castelo’ na Rua do Passeio, e
ao Correio da Manhã, no largo da Carioca — os carnavalescos da agremiação choravam o denodado presidente. A perpetuidade que eles haviam conferido ao consócio para tê-lo sempre na liderança dos
‘carapicus’ estava finda e Pádua de Vasconcelos, secretário-geral da sociedade,
externava, em sentida oração proferida no cemitério, o sentir dos alvinegros.
Havia, no entanto, nas hostes dos Democráticos, tantas vezes vitoriosos nas
pugnas de Momo, um antigo companheiro da diretoria presidida pelo saudoso Lord
Alisa, que viria a substituí-lo. Impregnado do mesmo amor ao clube, Lord Carta
Branca, então tesoureiro, viu seu nome e seu título carnavalesco terem o
sufrágio unânime de uma assembléia que, na mesma expansão de muitos anos antes,
dava-lhe a presidência perpétua do ‘castelo’.
Continuou, assim, o Clube dos Democráticos a manter sua
tradição e a fazer desfilar na terça-feira de Carnaval seus préstitos
alegóricos. Tudo com o mesmo esplendor do tempo em que Lord Alisa deles
participava, empunhando o estandarte preto e branco e agradecendo desvanecido
os aplausos do povo.
(O Jornal, 7/02/65)
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Fonte: Figuras e Coisas do Carnaval Carioca / Jota Efegê: apresentação
de Artur da Távola. —2. ed. — Rio de Janeiro: Funarte, 2007. 326p.
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